sábado, 20 de março de 2010

24 - Como os bons exemplos de idealismo podem inspirar o governo das empresas?

Outubro de 2009


Wangari Maathai nasceu em 1940. Filha de fazendeiros, estudou fora do seu país, Quênia, graduando-se em biologia no Mount Saint Scholastica College, em Atchison, Kansas (1964). Fez mestrado nos EUA, na University of Pittsburg (1966). Retornando à África, passou a coordenar um departamento da Universidade de Nairóbi. Dirigiu a Faculdade de Medicina Veterinária, sendo a primeira mulher da África Central a obter um título de PhD na University of Nairobi (1971). Sua formação abrange, ainda, estudos na Alemanha.


Maathai serviu ao National Council of Women of Kenya (1976-87), tendo sido presidente do seu conselho (1981-87). Foi a pessoa responsável pela introdução do conceito de plantio de árvores por cidadãos comuns (1976). Em 1977, criou o Movimento Cinturão Verde. Em 2002, tornou-se ministra de governo do Quênia. Em 2006, o presidente da França, Jacques Chirac, agraciou a professora Wangari Maathai com a mais importante honraria da França: a Legião de Honra.


O Quênia de Wangari Maathai tem sofrido, historicamente, com a devastação de suas florestas, em função do uso intensivo da lenha, insumo energético importante, em função da infra-estrutura energética deficiente local, especialmente, nos meses de frio.



Primeira mulher africana a ganhar o Prêmio Nobel da Paz, em 2004, Maathai coordenou o Movimento Cinturão Verde (www.greenbeltmovement.org), iniciativa com quatro objetivos básicos: (1) fortalecer e expandir-se no Quênia; (2) compartilhar seu programa com outros países da África e além desse continente; (3) conferir poder aos africanos, especialmente às mulheres e meninas, fomentando sua liderança e habilidades empresariais; e (4) defender, em âmbito internacional, o meio ambiente, a boa governança, a equidade e a paz.


O Cinturão Verde, ao efetivar o plantio de milhões de mudas de árvores no Quênia e em países vizinhos, mudou a rota de destruição ambiental nas áreas de sua abrangência, gerando, ao mesmo tempo, trabalho, renda e dignidade para famílias muito pobres. Segundo a mentora da iniciativa: “[...] quando plantamos árvores, plantamos também sementes de paz” (Mundo sustentável, André Trigeiro, 2005).


Consideremos, agora, o caso de Aimorés, cidade mineira próxima do Espírito Santo, localizada entre o rio Doce e a estrada de ferro Vitória-Minas. O município sofreu, ao longo do tempo, um processo de empobrecimento e de perda de população, decorrente de anos de exploração comercial de madeira, desmatamento generalizado e atividades agrícolas e pecuárias sem maiores preocupações quanto à sustentabilidade. A natureza local revela paisagens degradadas, como resultado desse processo.


Nesse contexto, emergiu o Instituto Terra, associação civil, sem fins lucrativos, fundada em 1999 por Lélia Deluiz Wanick Salgado e Sebastião Ribeiro Salgado Júnior, fotógrafos internacionalmente conhecidos. Localiza-se na Fazenda Bulcão, em Aimorés, que tem uma área de 676 hectares, reconhecida como Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) pela Portaria IEF/MG Nº 081, promulgada em 07 de outubro de 1998; esta é a primeira RPPN criada em uma área degradada.


O Instituto Terra já plantou mais de um milhão de árvores e seus fundadores manifestaram o desejo de plantar 50 milhões de árvores em toda a bacia do rio Doce. É factível ver o impacto desse trabalho na própria Fazenda Bulcão, que foi do pai de Sebastião: o córrego Bulcão, que nasce na propriedade e havia se tornado um filete, teve seu curso ampliado. O clima na fazenda mostra diferença em relação ao de Aimorés, o que é interessante, visto que a fazenda situa-se naquela cidade.


O Instituto tem buscado promover mudança cultural, pelas vias da educação e do exemplo. Tem um curso avançado permanente, de dois anos de duração, em regime de residência, de técnico agrícola ambiental; forma 10 alunos por turma, egressos da escola técnica agrícola e recebe 10 alunos, por promoção, da Universidade de Santa Fé, no Novo México, com a qual mantém convênio. A cada ano, alunos brasileiros e oriundos dos EUA ali aprendem como desenvolver a agricultura de forma ambientalmente correta.


A atuação do Instituto tem permitido injetar, por meio de vários projetos, dinheiro na economia do município de Aimorés, não só via empregos diretos de pessoas da região, mas também por outros caminhos. Como a entidade terceiriza atividades como alimentação, transporte e outras, ela cria oportunidades de trabalho para terceiros. Exemplificando: a alimentação de funcionários, estudantes, professores e visitantes é servida por restaurante local, licitado. Como resultado dessa forma de trabalhar, abriram-se em Aimorés novos restaurantes e novos hotéis, visto que há mais visitantes, que buscam o Instituto Terra. Um cinema do Instituto resultou da doação do governo de Astúrias e de Robin Williams e, nesse cinema, filmes como O Código Da Vinci, A Sociedade dos Poetas Mortos ou Uma Verdade Inconveniente, de Al Gore, puderam ser vistos por vários cidadãos locais.


Eis a visão do Instituto Terra: “retornar a Mata Atlântica ao Vale do Rio Doce com toda a sua rica diversidade, estimular o desenvolvimento social eco-sustentável na região, visando tornar possível a vida no meio rural, através da recuperação, conservação e uso equilibrado do meio ambiente, evitando o êxodo e trazendo de volta os que foram obrigados a imigrar. Estabelecer o Instituto como um centro de excelência nas áreas de recuperação e educação ambiental, desenvolvimento sustentável e mobilização social” (www.institutoterra.com.br).


Muito bem, mas o que essas e outras iniciativas edificantes têm a ver com a governança das empresas?


Talvez esses exemplos inspirem a alta administração das empresas a adotarem, de forma séria – e não apenas para fins de marketing institucional - o conceito de sustentabilidade nas vertentes econômica, social e ambiental, perseguindo maior eficácia no uso dos recursos naturais, provocando menos degradação ambiental e, consequentemente, social e criando novos negócios. Lembramos, ainda, que a inteligência disponível no mundo também deve servir a outras causas, tão válidas e importantes quanto buscar rentabilizar os recursos dos investidores; nesse sentido, as empresas podem identificar as iniciativas consideradas compatíveis com a visão de mundo de seus administradores e apoiá-las. Com recursos financeiros? Pode ser que sim, mas também com inteligência; afinal, compartilhar a inteligência disponível no mundo também é ser responsável.



MMB - Publicado na Revista RI

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