sábado, 20 de março de 2010

11 - Como os conselhos de administração podem favorecer o empreendedorismo nos negócios?

Setembro de 2008


Há algum tempo, aguardávamos um vôo no aeroporto de Confins, próximo a Belo Horizonte, para a cidade de São Paulo, quando nos deparamos, na livraria onde passávamos parte de nosso tempo de espera, com o livro denominado Acredite em você mesmo e vá em frente, de autoria do célebre empresário inglês Richard Branson, acionista controlador do grupo Virgin. Há quem diga que não existe acaso, e se isso é verdade, parece se aplicar ao presente artigo, inspirado na primeira leitura que fizemos quando abrimos ao acaso o livro com a sorridente foto de seu autor na capa: lá estava a pequena história da abertura e fechamento de capital da Virgin, contada por Branson no capítulo 5. Mas antes de refletir sobre essa passagem, vale a pena dizer algo sobre o autor.


Nascido em Londres em 1950, Richard Branson iniciou sua carreira empresarial aos 15 anos, por meio da criação da revista Student, seu primeiro empreendimento. O autor relata, no início do livro, a fórmula que fez a Student dar certo: planejamento e persistência. Branson afirma que ele e seu colega de escola Jonny Gems passaram dois anos, por ele considerados muito divertidos, escrevendo centenas de cartas com oferta de espaço de propaganda, além de também tentaram entrevistas com pessoas famosas. Isso terminou dando certo. Apoiado pelos pais, Branson deixou a escola para cuidar da revista e acampado com Gems no porão da casa dos pais de seu amigo, passou a cuidar exclusivamente do empreendimento. Os jovens sócios conseguiram entrevistas com pessoas famosas como os cantores John Lennon e Mick Jagger e os atores Vanessa Redgrave e Duddley Moore, tendo sido os primeiros a vender discos a baixo preço pelo correio. Com o tempo, passaram a vender discos em múltiplos pontos em várias cidades da Inglaterra. O negócio prosperou e a Virgin Music foi alcançando cada vez maior sucesso.


Outro capítulo interessante da trajetória de Branson diz respeito à criação de uma companhia aérea. A história teve os seus primórdios em 1977, quando o empresário teve o dissabor de chegar ao aeroporto em uma ilha onde terminara de passar férias e ver cancelado seu vôo previsto para Porto Rico. Como ninguém se movia, Branson fretou um vôo por dois mil dólares, dividindo esse valor pelo número de viajantes, o que resultou no custo de 39 dólares por pessoa a viajar. Pedindo uma lousa emprestada, nela escreveu: Virgin Airways, 39 dólares por pessoa. Vôo de ida para Porto Rico. Anos após, em 1984, o empresário recebeu a proposta de um novo negócio, visando a criação de uma companhia destinada a fazer vôos entre a Inglaterra e os EUA. A lembrança da história do fretamento e o modelo de negócio proposto impressionaram Branson e, após fazer pesquisas e enfrentar as opiniões contrárias aos seus planos, ele criou a Virgin Atlantic. Tornar a empresa um negócio atrativo não foi fácil, em função da regulamentação e, principalmente, das reações da concorrência, mas a empresa parece ter superado os tempos pioneiros mais difíceis.


O livro de Richard Branson apresenta diversas outras passagens interessantes, abrangendo as aventuras de seu autor por ar e mar, em geral, corridas de balão e de barco consistentes com a sua personalidade ousada e afeita a desafios. Mas o que mais nos chamou a atenção foi a pequena história da abertura e fechamento de capital do grupo, narrada pelo empresário. Em 1986, a Virgin era uma das maiores empresas privadas da Grã Bretanha, com quatro mil funcionários e as vendas tinham crescido 60% no ano anterior. Branson foi aconselhado a vender ações para o público; dois de seus sócios não apreciaram a idéia, apontando o risco da perda de controle vis-à-vis do perfil pessoal do empreendedor. Pressionado por banqueiros e com o olhar voltado ao sucesso da abertura de capital de empresas como a Body Shop, de Anita Roddick e outras, o empresário foi em frente e abriu sua empresa na Bolsa de Valores.


Segundo Branson afirma, cerca de 60 mil pessoas manifestaram interesse nas ações da Virgin por correio. Adicionalmente, filas se formaram na City Londrina, com muitos desejando comprar pessoalmente as ações da empresa. Branson diz que jamais se esquecerá de sua caminhada ao longo da fila, agradecendo ao público a confiança depositada em seu trabalho. Alguns diziam que estavam abrindo mão de suas férias para investir na empresa; outros, que estavam colocando suas economias baseadas na confiança em Branson. Mas apesar desse início emocionante, não demorou muito tempo para o empresário detestar o novo sistema. Ao invés de reuniões informais com seus sócios em sua casa-barco, agora tinha que conviver com um conselho de administração e essa convivência incluía aspectos como aguardar a reunião mensal para tomar decisões relevantes, conviver com conselheiros que não tinham bom conhecimento do negócio de música e ouvir críticas sem fundamentação profunda a artistas que desejaria contratar, como Mick Jagger. Acostumado a tomar decisões de forma rápida, o empresário se sentiu tolhido. Quando as ações da Bolsa de Valores começaram a cair, ainda que não por sua culpa, Richard Branson tomou uma decisão: recomprar as ações e trazer a empresa ao status inicial. A decisão foi implementada pelo valor de 182 milhões de libras e Branson afirma que no dia em que voltou a ser dono de suas ações, sentiu-se aliviado e, novamente, senhor do seu destino.


Feitas essas considerações, retornemos à questão do título desse artigo: como os conselhos de administração podem favorecer o empreendedorismo nos negócios? A pequena história da abertura e fechamento de capital da empresa de Richard Branson faz pensar. Não se discute a grande importância dos mercados financeiros e de capitais para o fortalecimento das economias capitalistas e para a democratização do capital na sociedade; nessa lógica, fechamentos de capital incomodam, pois sempre se espera e torce para que as empresas tenham sucesso ao se abrirem para o mercado. Talvez exista algum exagero de nossa parte nesse incômodo, mas mesmo assim, nos atrevemos aqui a comentar dois aspectos apontados por Richard Branson ao relatar suas dificuldades com a nova forma de governança dos negócios.


Primeiramente, desponta o aspecto de que a necessária burocratização dos trabalhos de um conselho de administração não deveria prejudicar negócios que necessitam de decisões ágeis, travando o empreendedorismo empresarial. Em um contexto de concorrência acirrada, em que os agentes se movem de forma rápida, é razoável esperar pelo próximo mês para discutir o que deve ser discutido no momento presente? A nós, parece que não. Em segundo lugar, aparece a relevante questão da escolha de conselheiros que busquem compreender os negócios sobre os quais devem tomar decisões. Conselheiros não precisam entender de todos os negócios, mas devem estar dispostos a buscar entender razoavelmente bem os vários modelos de negócios abrigados sob um grupo empresarial. Em suma, os conselhos de administração devem estar afinados com a dinâmica real do ambiente da empresa.


Richard Branson é um empresário bem sucedido, que faz diversas recomendações em seu livro a quem deseja empreender com sucesso, entre as quais planejar, perseverar e fazer acontecer. Auto-ajuda pura e simples? Pode até ser ou parecer, mas a nós, parece que os conselhos de administração necessitam utilizar formas concretas de ajudar as diretorias executivas no fazer acontecer quando e onde necessário. A tecnologia está aí para ajudar.



MMB - Publicado na Revista RI

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