sábado, 20 de março de 2010

1 - De que os investidores mais necessitam?

Agosto de 2007


Antes de responder a pergunta acima, gostaríamos de apresentar nosso conceito preferido de governança, sem a pretensão de concorrer com outras formas de conceituar o tema - pois existem várias e, certamente, melhores -, mas com o objetivo específico de criar o pano de fundo que qualificará melhor nossa resposta.

Optamos aqui por uma visão abrangente e - quem sabe? - possivelmente, extensiva às várias organizações de uma economia capitalista: governança, ou melhor, governança organizacional. É a condução das atividades organizacionais, ou seja, a administração vista sob a perspectiva da cúpula da organização, abrangendo um conjunto de funções e um sistema de governança que buscam longevidade e sucesso em objetivos e metas.


E quais seriam tais funções e sistema? Quanto às funções ou deveres da governança, relacionamos os cinco seguintes, não exaustivos: 1. definição de padrões éticos, políticas e práticas de condução administrativa; 2. definição da estratégia - acreditando que todas as organizações tenham uma estratégia, um caminho a perseguir, mesmo quando ele não é explicitado; 3. relacionamento com públicos relevantes como acionistas, empregados, clientes, fornecedores e outros que podem causar transtorno às organizações, se não forem considerados; 4. produção de informações para esses públicos; 5. equacionamento de riscos organizacionais.



Já, no que se refere ao sistema de governança, gostaríamos de citar os diversos instrumentos organizacionais que operam de forma conjunta e interligada com vistas a operacionalizar, na prática, as funções acima citadas: códigos de conduta ética, políticas de condução administrativa, conselhos de administração e fiscal, comitês do conselho, administração, práticas de governança, processos e rotinas que são exemplos de componentes que integram o sistema de governança de uma organização.


Notemos que parte do sistema de governança é imposta pela legislação; parte, pelas regulamentações vigentes nos mercados financeiro e de capitais - sem esquecer aquelas estabelecidas por outros mercados - e parte, pela própria organização. E observemos que, se as considerações acima forem válidas, governança não seria uma espécie de sistema de gestão, mas a própria gestão per se no nível da cúpula organizacional, com funções apoiadas por um sistema com os elementos acima enunciados.


Complementamos as considerações acima dizendo que, se, por um lado, visualizamos a governança centrada na cúpula das organizações de todos os tamanhos, ambiente em que transita um número restrito de pessoas, como conselheiros formais e informais, presidentes, diretores e alguns especialistas com acesso às discussões e decisões em primeira mão, por outro, entendemos que as regras e decisões oriundas do ambiente de governança permeiam toda a organização, abrangendo desde o seu principal dirigente até o colaborador posicionado geográfica ou administrativamente mais longe das decisões. Dito de outra forma: se a qualidade da governança se define no topo da organização (o comando vem de cima, por mais democracia que exista no processo decisório), os desdobramentos e conseqüências perpassam toda a organização (todos nós sentimos os efeitos).



Retornemos, nesse ponto, às companhias de capital aberto e à pergunta inicial deste artigo; a resposta poderia ser longa, mas tentaremos resumir: investidores do mercado de capitais necessitam conhecer os princípios éticos e as políticas de governança corporativa, esperando que sejam efetivamente implementados na prática. Estamos aqui tratando de um dos itens mais relevantes de um sistema de governança. Por quê?


Lembremo-nos de que grande parte desses investidores está distante da administração da empresa, mesmo quando está representada por um dos membros do Conselho de Administração, conforme permite a Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404, de 15/12/76, modificada pela Lei n. 10.053, de 31/10/2001). Afinal, o Conselho, entre outros públicos privilegiados (insiders), deve guardar reserva sobre assuntos cuja divulgação prejudicaria os acionistas, segundo os preceitos legais. Por isso, conhecer os princípios éticos e as políticas de governança das companhias em que investem se torna muito importante para os pequenos acionistas. Explicitar esses tópicos para investidores pulverizados pelo mercado - eventualmente, em outros países - seria muito positivo e bem-vindo. E praticá-los, seria absolutamente necessário, para criar aderência entre discurso e prática. Da implementação de uma ética elevada e das boas políticas, emergirá a adoção de boas práticas de governança corporativa.



Em reuniões de empresas realizadas com investidores no Brasil, percebemos que empresas sérias têm a oportunidade de explorar melhor com os investidores sua ética, políticas de governança e o que elas contemplam (o que, por vezes, não é pouco). Isso nos parece muito fácil de ser alcançado, para as empresas que assim o desejarem. Podemos argumentar que, nesses encontros com investidores, apenas especialistas que já conhecem bem a empresa, a legislação e a regulamentação do mercado estarão presentes. Mas isso não é verdade. Com o desenvolvimento dos mercados de capitais e de ações, investidores têm ampliado seu interesse e comparecido aos encontros com empresas, em busca de informação. E é importante conhecerem melhor as regras do jogo das empresas nas quais poderão investir.


Empresas sempre têm uma ética e políticas de governança, mesmo que não formalmente explicitados. Tomemos as funções de governança mencionadas na parte inicial deste artigo. A primeira função citada menciona a definição de princípios éticos e políticas de condução administrativa. E as políticas podem ser variadas. Por exemplo, quando aderem ao Nível 1 de governança corporativa, empresas adotam uma política de informações, com transparência muito acima do requisito legal. Quando aderem ao Nível 2 ou ao Novo Mercado, aderem a essa política citada e a uma política de direitos dos investidores mais exigente do que a própria lei. E quanto à política de dividendos? E a política de responsabilidade social? E várias outras políticas relevantes para quem investe e quer segurança?


Expressamos, finalizando, o nosso ponto de vista de que governança não é mais um conceito fashion, como tantos que possam ornamentar as bibliotecas das escolas de administração. Não, a julgar pelos vetores que têm impulsionado um movimento nacional pela governança corporativa, como as pressões emergentes da globalização financeira e do interesse de investidores globais em acessar alternativas de investimento nos mercados, com maiores retornos e riscos sob controle aceitável. Assim sendo, acreditamos que as discussões sobre governança vieram para ficar.



MMB- Publicado na Revista RI

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